26 de nov. de 2013

BOM SENSO, MAS NEM TANTO


A briga do Bom Senso FC, por enquanto, é corporativista. Tudo o que os jogadores querem são condições melhores de trabalho e salários em dia. O que torna o movimento interessante é seu ineditismo. Pela primeira vez atletas de futebol se unem como uma classe trabalhadora, dando um viés político ao esporte.
Em comparação à Democracia Corinthiana, por exemplo, o Bom Senso é um movimento mais estreito em sua finalidade. Enquanto o primeiro se preocupava com um bem mais amplo para a população (eleições diretas), o último está apenas atento às questões próprias. Isso, no entanto, não reduz a força do fato histórico que é o Bom Senso FC.
Me parece que essa preocupação corporativista não é exclusividade de atletas brasileiros. Na França, apoiados pelos dirigentes de clubes, os jogadores ameaçaram paralisar o campeonato nacional caso fosse aprovada uma lei que taxaria em 75% os salários que ultrapassassem 1 milhão de euros por ano. A medida acompanharia outros setores da economia, não só o futebol. Houve chiadeira geral e a lei foi vetada, pelo menos por enquanto.
A briga francesa é diferente da brasileira. Por lá, não há problema de atrasos salariais e as pré-temporadas são respeitadas. O que os jogadores do campeonato francês temem é a quebra dos clubes e a consequente seca das fontes. Ou seja: embora por motivos diferentes, as preocupações em ambos os países têm o mesmo fundo.
Só para que se tenha uma ideia, Ibrahimovic, o maior salário da Ligue1, ganha cerca de 15 milhões de euros por ano. Thiago Silva, outra estrela, tira algo em torno de 9,6 milhões anuais. Uma taxação de 75% sobre esses salários poderia representar o fim do PSG. A alternativa seria abaixar os salários dos atletas que, convenhamos, são estratosféricos.
Há muito tempo o futebol perdeu a noção de realidade. Quem vive na alta esfera do esporte está em um mundo à parte. A quantidade de dinheiro que circula no futebol contribui consideravelmente para a piora da situação nos rincões mais pobres da humanidade. É a tal distribuição desigual de renda.
O raciocínio é simples: enquanto a grana circula no esporte bretão, ela deixa de estar em outras esferas. Não só com o futebol esse fenômeno ocorre. Há também as grandes corporações mundiais que detêm a maior parte do dinheiro circulante e que contribuem para as desigualdades. O continente africano sofre com cerca de 1 milhão de mortos por malária a cada ano. Em torno de 71% dos infectados por HIV no mundo encontram-se na África. Quase 2/3 da população africana vivem abaixo da linha da pobreza. Mas essa não deve ser, de forma geral, uma preocupação dos atletas.

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